Então, para despertar o nosso torpor, lembrei que tomássemos o divino chá - ocupação bem harmónica com a tarde triste, a chuva grossa alagando os vidros, e a clara chama bailando no fogão. Jacinto acedeu - e um escudeiro acercou logo a mesa de Efraim para que nós lhe estreássemos os serviços destros. Mas o meu Príncipe, depois de a altear, para o meu espanto, até aos cristais do lustre, não conseguiu, apesar de uma suada e desesperada batalha com as molas, que a mesa regressasse a uma altura humana e caseira. E o escudeiro de novo a levou, levantada como um andaime, quimérica, unicamente aproveitável para o gigante Adamastor.
Depois veio a caixa do chá entre chaleiras, lâmpadas, coadores, filtros, todo um fausto de alfaias de prata, que comunicavam a essa ocupação, tão simples e doce em casa da minha tia, fazer chá, a majestade de um rito. Prevenido pelo meu camarada da sublimidade daquele chá de Kiang-Su, ergui a chávena aos lábios com reverência. Era uma infusão descorada que sabia a malva e a formiga. Jacinto provou, cuspiu, blasfemou... Não tomámos chá.
Ao cabo de outro pensativo silêncio, murmurei, com os olhos perdidos no lume: - E as obras de. Tormes? A igreja... já haverá igreja nova? Jacinto retomara o papel e a tesoura: - Não sei... Não tornei a receber carta do Silvério... Nem imagino onde param os ossos... Que lúgubre história!
Depois chegou a hora das luzes e do jantar. Eu encomendara pelo Grilo ao nosso magistral cozinheiro uma larga travessa de arroz-doce, com as iniciais de Jacinto e a data ditosa em canela, à moda amável da nossa meiga terra. E o meu Príncipe à mesa, percorrendo a lâmina de marfim onde no 202 se escreviam os pratos a lápis vermelho, louvou com fervor a ideia patriarcal:
- Arroz-doce! Está escrito com dois ss, mas não tem dúvida.