Ali, mas agora, com que segurança e idílico amor ele se movia através dessa Natureza, donde andara tantos anos desviado por teoria e por hábito! já não arreceava a humidade mortal das relvas; nem repelia como impertinente o roçar das ramagens; nem o silêncio dos altos o inquietava como um despovoamento do Universo. Era com delícias, com um consolado sentimento de estabilidade recuperada, que enterrava os grossos sapatos nas terras moles, como no seu elemento natural e paterno: sem razão, deixava os trilhos fáceis, para se embrenhar através de arbustos emaranhados, e receber na face a carícia das folhas tenras; sobre os outeiros, parava, imóvel, retendo os meus gestos e quase o meu hálito, para se embeber de silêncio e de paz: e duas vezes o surpreendi atento e sorrindo à beira de. um regatinho palreiro, como se lhe escutasse a confidência...
Depois filosofava, sem descontinuar, com o entusiasmo de um convertido, ávido de converter:
- Como a inteligência aqui se liberta, hem? E como tudo é animado de uma vida forte e profunda!... Dizes tu agora, Zé Fernandes, que não há aqui pensamento...
- Eu?! Eu não digo nada, Jacinto... - Pois é uma maneira de refletir muito estreita e muito grosseira... - Ora essa! Mas eu... - Não, não percebes. A vida não se limita a pensar, meu caro doutor... - Que não sou!
- A vida é essencialmente Vontade e Movimento: e naquele pedaço de terra, plantado de milho, vai todo um mundo de impulsos, de forças que se revelam, e que atingem a sua expressão suprema, que é a Forma. Não, essa tua filosofia está ainda extremamente grosseira...
- Irra! mas eu não... - E depois, menino, que inesgotável, que miraculosa diversidade de formas... E todas belas!
Agarrava o meu pobre braço, exigia que eu reparasse com reverência.