Nem festas, nem teosofismos, nem os seus hospícios, nem os fios do «Times», pareciam interessar agora o meu amigo, mesmo como demonstrações gloriosas da sua Crença. E a sua abominável função de novo se limitou a bocejar, a passar os dedos moles sobre a face pendida, palpando a caveira. Incessantemente aludia à morte como a uma libertação. Uma tarde mesmo, no melancólico crepúsculo da Biblioteca, antes de refulgirem as luzes, consideravelmente me aterrou, falando num tom regelado de mortes rápidas, sem dor, pelo choque de uma vasta pilha elétrica ou pela violência compassiva do ácido cianídrico. Diabo! O Pessimismo, que aparecera na Inteligência do meu Príncipe como um conceito elegante - atacara bruscamente a Vontade!
Todo o seu movimento então foi o de um boi inconsciente que marcha sob a canga e o aguilhão. Já não esperava da Vida contentamento - nem mesmo se lastimava que ela lhe trouxesse tédio ou pena. «Tudo é indiferente, Zé Fernandes!» E tão indiferentemente sairia à sua janela para receber uma coroa imperial oferecida por um povo - como se estenderia numa poltrona rota para emudecer e jazer. Sendo tudo inútil, e não conduzindo senão a maior desilusão, que podia importar a mais rutilante atividade ou a mais desgostada inércia? O seu gesto constante, que me irritava, era encolher os ombros. Perante duas ideias, dois caminhos, dois pratos, encolhia os ombros! Que importava?.. E no mínimo acto, raspar um fósforo ou desdobrar um jornal,
punha uma morosidade tão desconsolada que todo ele parecia ligado, desde os dedos até à alma, pelas voltas apertadas de uma corda que se não via e que o travava.
Muito desagradavelmente me recordo do dia dos seus anos, a 10 de Janeiro. Cedo, de manhã, recebera, com uma carta de Madame de Trèves, um açafate de camélias, azáleas, orquídeas e lírios do vale.