Os Crimes da Rua Morgue - Cap. 1: Os crimes da Rua Morgue Pág. 9 / 42

Tu tropeçaste num calhau, escorregaste, feriste-te sem gravidade num tornozelo, pareceste ficar vexado ou aborrecido, resmungaste urnas palavras, viraste-te para olhar para o monte de pedras e depois continuaste a andar em silêncio. Eu não estava a prestar uma atenção especial ao que fazias; mas para mim a observação tornou-se há muito uma espécie de necessidade.

»Caminhavas de olhos postos no chão, a fitar com ar irritado os buracos da calçada (de forma que percebi que continuavas a pensar nas pedras), até que chegámos à Travessa Lamartine, que foi pavimentada, à laia de experiência, com blocos unidos e justapostos. Aqui ficaste com ar mais bem disposto, e vendo os teus lábios mexerem-se, percebi perfeitamente que tinhas murmurado a palavra «estereotomia», um termo pomposamente aplicado a esta espécie de pavimento. Sabia que não podias estar a dizer para ti mesmo «estereotomia» sem te lembrares dos átomos e das teorias de Epicuro. E, como quando discutimos esse assunto, ainda não há muito tempo, te fiz ver que as conjecturas desse nobre grego tiveram uma singular confirmação, embora poucos dessem por ela, nas recentes teorias sobre a cosmogonia das nebulosas, senti que não podias deixar de olhar para a grande nebulosa de Oríon, e a verdade é que esperava que o fizesses.

Tu ergueste realmente os olhos; e eu tive então a certeza de que estava a seguir passo a passo os teus pensamentos. Ora, naquela violenta crítica a Chantilly publicada no Musée de ontem, o crítico, referindo-se com pouca cortesia à mudança de nome do remendão quando calçou o coturno, citava um verso latino que muitas vezes citámos em conversa. Refiro-me a

Pediti antiquun litera prima sonum. (a primeira letra destrói o som antigo)

»Este





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