William Wilson - Cap. 1: William Wilson Pág. 8 / 27

Não me era possível conceber que este estranho comportamento se radicasse noutro motivo que não fosse uma consumada presunção que assumia o tom vulgar do paternalismo e da protecção.

Talvez fosse esta última característica da conduta de Wilson, aliada à nossa identidade de nomes, e ao mero acaso de termos entrado para a escola no mesmo dia, que espalhou, entre as classes mais adiantadas, a noção de que éramos irmãos. Os alunos dessas classes não costumavam investigar com grande minúcia os assuntos dos mais novos. Disse já, ou devia tê-lo dito, que Wilson não tinha qualquer parentesco, por mais afastado que fosse, com a minha família. No entanto, se fôssemos irmãos, certamente seríamos gémeos, visto que, após deixar a escola do Dr. Bransby, soube acidentalmente que o meu homónimo nascera em 19 de Janeiro de 1813 - e a coincidência é notável, pois trata-se precisamente do dia em que eu próprio nasci.

Poderá parecer estranho que, apesar da constante ansiedade que me provocavam a rivalidade de Wilson e o seu intolerável espírito de contradição, eu não conseguisse odiá-lo de todo. É certo que tínhamos discussões quase diárias, nas quais ele, cedendo-me publicamente os louros da vitória, de certo modo arranjava maneira de fazer-me sentir que era ele quem os merecia; contudo, um sentido de amor-próprio da minha parte e uma verdadeira dignidade pelo lado dele sempre nos mantiveram dentro daquilo a que se chama «relações normais», ao mesmo tempo que havia muitos pontos de grande identidade nos nossos temperamentos que despertavam em mim um sentimento que só a nossa situação porventura impediu de florescer em amizade. É efectivamente difícil definir, ou sequer descrever, os meus verdadeiros sentimentos por ele. Constituíam uma amálgama variada e heterogénea: uma certa animosidade petulante, que não chegava a: ódio, alguma consideração, ainda mais respeito, muito receio e um mundo de constrangida curiosidade.





Os capítulos deste livro