Schopenhauer, que não ocultou a dificuldade que o lírico apresenta para a consideração filosófica da arte, acredita ter achado uma saída, à qual não o posso acompanhar: — porque a ele somente, em sua profunda metafísica da música, foi dado o meio com o qual poderia ter sido afastada definitivamente aquela dificuldade; como creio tê-lo feito aqui, segundo seu espírito e para sua honra. Ele ao contrário indica como a essência própria da canção o que segue (O mundo como vontade e representação I):
“É o sujeito da vontade, quer dizer, da vontade própria, que enche a consciência daquele que canta, frequentemente como um desejo desligado, satisfeito (alegria), mas talvez mais frequentemente ainda como um reprimido (tristeza), sempre como afeto, paixão, estado de ânimo agitado. Ao lado deste, porém, e ao mesmo tempo com ele se sente o que canta, pelo aspeto da natureza que o rodeia como sujeito do conhecimento puro, desprovido de vontade, cuja inabalável tranquilidade de alma entra então em contraste com o impulso da vontade sempre limitada, sempre indigente ainda; o sentimento deste contraste, desta mudança e aquilo que se expressa no conjunto da canção e o que constitui o estado lírico. Neste se nos aproxima, se assim podemos dizer, o conhecimento puro, a fim de nos libertar da vontade e de seu impulso. Seguimos, mas apenas por alguns instantes, sempre a vontade; a recordação de nossos fins pessoais nos arranca da contemplação tranquila; mas também novamente nos tira da vontade a bela vizinhança próxima, na qual se nos oferece o conhecimento puro, desprovido de desejo.