Comoveu-se; porém, ao lobrigar - levantando-se custosamente sobre as patas que tremiam - o velho Árgus, amigo de sempre! Deixara-o com melancolia imensa quando partira para Tróia. Em criança, compartilhara o cão de todos os folguedos do dono. Corriam juntos, juntos caçavam lebres, cabras selvagens, e os esquivos veados. Ulisses dava-lhe de comer na mão. E ai de quem tocasse no menino! Logo mordia o malvado, logo ladrava para afastar a gente de má catadura. Também, estimavam-no a valer. De pêlo nédio e lavado, jamais lhe faltava a comida - e até acepipes da própria mesa de Ulisses. Pertencia à família. E hoje, - pensava Ulisses - como tratariam o velho Árgus?
A grande aflição que reinava na alma de Penélope e de Telémaco não os deixava, - bem se via - cuidar do mísero animal. Trôpego; lazarento, magro, sujo, o cão envelhecera depressa. Deitara-se fora do canil, em cima do estrume, devorado de pulgas, quase cego. Mas, ao ouvir a voz de Ulisses, mexeu a cauda, encolheu as orelhas, quis erguer-se. Coitadito! Não teve forças para correr, latindo e saltando, ao encontro do dono. Quem sabe se então lhe lembrariam as brincadeiras doutros tempos, as impetuosas caçadas aos bichos bravos, a força com que dominava os ladrões perigosos, o entusiasmo que o