O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 120 / 279

É preciso, como diz Vautrin, transformar-se em bala de canhão.» As amargas reflexões do estudante foram depressa dissipadas pelo prazer que se prometia jantando com a viscondessa. Assim, por uma espécie de fatalidade, os mais pequenos acontecimentos da sua vida conspiravam para o empurrar para a carreira onde, seguindo as terríveis observações da esfinge da Casa Vauquer, devia, como num campo de batalha, matar para não ser morto, enganar para não ser enganado; onde devia depositar na fronteira a sua consciência, o coração, pôr uma máscara, gozar sem piedade pelos homens, e, como a Lacedemonia, apanhar a fortuna sem ser visto, para merecer o coroa. Quando voltou a casa da viscondessa, encontrou-a cheia dessa bondade graciosa que ela lhe tinha sempre testemunhado. Ambos foram para uma sala de jantar onde o visconde esperava a mulher e onde resplandecia esse luxo da mesa que sob a Restauração foi levado, como todos sabem, ao mais alto grau. O senhor de Beauséant, igual a muitos outros nobres, já não tinha muito mais prazeres do que o da boa mesa; tinha com efeito essa gulodice da escola de Luís XVIII e do duque d'Escars. A sua mesa oferecia por isso um duplo luxo, o do conteúdo e o do recipiente. Nunca tal espectáculo tocara os olhos de Eugène, que jantava pela primeira vez numa dessas casas onde a grandeza social é hereditária. A moda tinha acabado de suprimir a sopa que terminava antigamente os bailes do império, onde os militares precisavam retemperar forças para se prepararem a todos os combates que os esperavam tanto dentro como fora. Eugène só tinha por enquanto assistido a bailes. O aprumo que mais tarde o distinguiria, e que começava a ter, impediu-o de se extasiar como um burro frente a um palácio. Mas ao ver toda esta prata




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