Depressa o silêncio reinou na sala de jantar. Os pensionistas separaram-se para dar passagem a três desses homens, que tinham todos a mão no bolso de lado onde seguravam uma pistola armada. Dois polícias que seguiam os agentes ocuparam a porta do salão e outros dois apontaram para a que dava para as escadas. O passo e as armas de vários soldados ressoaram na calçada que ladeava a fachada. Qualquer esperança de fuga foi desta forma interdita a Morte-em-Pé, sobre quem todos os olhares se fixaram irresistivelmente. O chefe foi direito a ele, começou por lhe dar na cabeça uma palmada tão violenta que lhe fez saltar a peruca e devolveu à cabeça de Collin todo o seu horror. Acompanhadas de cabelos cor de tijolo e curtos que lhes davam um carácter assustador de força misturada com manha, esta cabeça e esta cara, em harmonia com o busto, foram inteligentemente iluminadas como se os fogos do inferno as tivessem alumiado. Todos compreenderam tudo sobre Vautrin, o passado, o presente, o futuro, as doutrinas implacáveis, a religião de seu bel-prazer, a realidade que lhe dava o cinismo dos seus pensamentos, actos, e a força de uma organização pronta a tudo. O sangue subiu-lhe à cara e os olhos brilharam como os de um gato selvagem. Saltou sobre si mesmo com um movimento cheio de uma energia tão feroz, rugiu tão bem que arrancou gritos de terror a todos os pensionistas. A este gesto de leão, e apoiando-se no clamor geral, os agentes puxaram das pistolas. Collin compreendeu o perigo que corria vendo brilhar o cano da cada arma, e deu de repente a prova do mais alto poder humano. Horrível e majestoso espectáculo! A fisionomia dele apresentou um fenómeno que só pode ser comparado ao de uma caldeira cheia de vapor fumegante que levantaria montanhas e que dissolve num piscar de olho uma gota de água fria.
