O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 34 / 279

Antes de fechar a porta à chave, Christophe tinha-a aberto para olhar para a rua. Rastignac apresentou-se nesse momento e pôde subir ao quarto sem fazer barulho, seguido de Christophe que fazia muito. Eugene despiu-se, calçou as pantufas, vestiu um velho casaco, acendeu o lume de carvalho e preparou-se prontamente para o trabalho, de forma que Christophe ainda tapou com o barulho dos seus grossos sapatos os preparativos pouco ruidosos do jovem rapaz. Eugene ficou pensativo durante alguns momentos antes de mergulhar nos livros de Direito. Acabava de conhecer na casa da senhora de Beauséant, uma das rainhas da moda de Paris, e cuja casa passava por ser a mais agradável do Quartier Saint-Germain. Era, além disso, pelo nome e pela fortuna, uma das sumidades do mundo aristocrático. Graças à tia de Marcillac, o pobre estudante tinha sido bem recebido nessa casa, sem conhecer a extensão desse favor. Ser admitido nesses salões dourados equivalia a uma licença, a mais exclusiva de todas, tinha conquistado o direito de ir por todo o lado. Encandeado por essa brilhante assembleia, tendo apenas trocado algumas palavras com a viscondessa, Eugene tinha-se contentado em distinguir, por entre a multidão, divindades parisienses que se apertavam nessa festa mundana, uma dessas mulheres que deve adorar antes de mais um jovem rapaz. A condessa Anastasie de Restaud, grande e bem feita, passava por ter uma das cinturas mais belas de Paris. Imaginem uns olhos grandes pretos, uma mão magnífica, um pé bem desenhado, fogo nos movimentos, uma mulher que o marquês de Ronquerolles chamava de verdadeiro puro-sangue. Esta delicadeza de nervos não lhe tirava qualquer qualidade; tinha os contornos cheios e redondos, sem poder ser acusada de gorda. Cavalo puro-sangue, mulher de raça, essas alocuções começavam a substituir os anjos do céu, as figuras ossiânicas, toda a antiga mitologia amorosa posta de lado pelo dandismo.




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