O Pai Goriot - Cap. 1: O PAI GORIOT Pág. 99 / 279

Os defeitos, o mundo e a concretização dos seus desejos crescentes tinham-no pedido. Dentro das suas qualidades encontrava-se essa vivacidade meridional que faz fazer frente à dificuldade para a resolver e que não permite a um homem de além-Loire deixar-se ficar por incertezas, qualidade que as pessoas do Norte chamam defeito: para eles, se isso foi a origem da fortuna de Murat, foi também a causa de sua morte. Deveria concluir-se daqui que quando um meridional sabe unir a astúcia do Norte à audácia de além-Loire está completo e fica rei da Suécia. Rastignac não podia portanto ficar muito debaixo do fogo cruzado de Vautrin sem saber se esse homem era seu amigo ou inimigo. De tempos a tempos, parecia-lhe que este singular personagem penetrava nas suas paixões e lia o seu coração, enquanto tudo nele permanecia tão bem fechado que parecia ter a imobilidade de uma esfinge que sabe, vê tudo e não diz nada. Sentindo o bolsinho cheio, Eugène revoltou-se.

- Faça-me o favor de esperar - disse a Vautrin que se levantava para sair após ter saboreado os últimos goles de café.

- Porquê? - respondeu o quadragenário, pondo o chapéu de abas largas e pegando numa bengala de ferro com a qual fazia muitas vezes gestos cruzados como homem que não teme ser assaltado por quatro ladrões.

- Vou pagar-lhe - retomou Rastignac que desfez rapidamente um saco e entregou 140 francos à senhora Vauquer. As boas contas fazem os bons amigos, disse à viúva. Estamos pagos até São Silvestre. Troque-me estes 100 vinténs.

- Os bons amigos fazem as boas contas - repetiu Poiret olhando para Vautrin.

- Aqui estão 20 vinténs - disse Rastignac dando uma moeda à esfinge de peruca.

- Parece que tem medo de me dever algo? - gritou Vautrin lançando um olhar adivinho na alma do jovem a quem deitou um desses sorrisos de gozo e insolência contra os quais, por mais de cem vezes, Eugène quase se Insurgira.





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