— Em boa hora seja — disse o escudeiro.
A este tempo, porém, já havia saído do coche um homem que pelo traje mostrou logo o ofício e cargo que exercia, porque o seu vestido talar com mangas de pregas indicava ser efetivamente ouvidor, como tinha dito o criado. Trazia pela mão uma donzela, ao parecer de dezasseis anos, com vestido de jornada, e tão bizarra, galharda e formosa, que, ao verem-na, todos ficaram admirados, de sorte que, a não terem visto a Dorotéia, Lucinda e Zoraida, que estavam na venda, ficariam a crer que difícil seria encontrar outra formosura como a desta donzela.
D. Quixote achava-se presente quando entraram o ouvidor e a jovem, e disse-lhe apenas o viu:
— Pode Vossa Mercê entrar com segurança e passear por este castelo, pois que ainda que seja estreito e de poucos cômodos, nunca há estreiteza e falta deles no mundo que não dê lugar às armas e às letras, mormente se as armas e as letras trazem por guia e escudo a formosura, como a trazem as letras de Vossa Mercê na pessoa desta formosa donzela, diante da qual, para que passe, não só devem abrir-se e patentear-se todos os castelos, mas também devem desviar-se as rochas, e as montanhas dividir-se e abaixar-se. Entre Vossa Mercê neste paraíso, que achará aqui estrelas e sóis para acompanharem o céu que Vossa Mercê traz consigo: aqui achará igualmente bem representadas as armas e a peregrina formosura.
O ouvidor ficou admirado da alocução de D. Quixote e pôs-se a olhar para ele com toda a atenção, não lhe causando menor admiração a sua figura do que as suas palavras, e sem lhe dar nenhumas em resposta, ficou novamente surpreso quando viu diante de si Lucinda, Dorotéia e Zoraida, as quais, tendo notícia dos novos hóspedes, e encarecendo-lhes a vendeira a formosura da donzela, tinham saído ao seu encontro para a verem e receberem; mas D.