Nos dedos da mão esquerda, trazia um coto de vela aceso, que resguardava com a mão, para que lhe não desse a luz nos olhos, tapados por uns óculos; vinha com um pisar manso e movendo-se brandamente. Contemplou-a D. Quixote do sítio onde estava de atalaia, e o andar dela e o silêncio fizeram-lhe supor que era alguma bruxa ou maga, que vinha praticar os seus malefícios, e começou-se a benzer muito depressa. Foi-se chegando a visão e, quando estava a meio do aposento, viu a pressa com que D. Quixote se persignava; e, se ele ficou medroso ao ver a figura dela, ficou ela mui assustada ao ver a dele, porque, ao dar com esse vulto tão alto e tão amarelo, com a colcha e os parches, que o desfiguravam, soltou um grande brado, dizendo:
— Jesus! que vejo eu?
E, com o sobressalto, caiu-lhe a vela das mãos, e achando-se às escuras, voltou as costas para se ir embora, mas, com o medo, tropeçou nas saias, e deu uma grande queda. D. Quixote, receoso, começou a dizer:
— Esconjuro-te, fantasma, ou quem quer que sejas, para que me digas quem és e o que de mim requeres. Se és alma penada, diz-mo, que eu farei por ti tudo quanto as minhas forças alcançarem, porque sou católico cristão e amigo de fazer bem a toda a gente, e para isso tomei a profissão da cavalaria andante, que até se estende a fazer bem às almas do purgatório.
A aflita dona, que ouviu os esconjuros, pelo seu temor coligiu o de D. Quixote e, com voz aflita e baixa, lhe respondeu:
— Senhor D. Quixote (se por acaso Vossa Mercê é D. Quixote), não sou fantasma, nem visão, nem alma do purgatório, como Vossa Mercê parece que pensou, mas sim dona Rodríguez, a dona de honor da senhora duquesa, que venho ter com Vossa Mercê, por causa de uma aflição, daquelas que Vossa Mercê costuma remediar.