“Não faças muitas pragmáticas, e, se as fizeres, procura que sejam boas, e sobretudo que se guardem e se cumpram; que as pragmáticas que se não guardam é o mesmo que se não existissem; antes mostram que o príncipe, que teve discrição e autoridade para as promulgar, não teve valor para fazer com que se cumprissem, e as leis que atemorizam e não se escutam, vêm a ser como o cepo, esse rei das rãs, que ao princípio as espantou e depois o menosprezaram e treparam para cima dele. Sê pai das virtudes, e padrasto dos vícios. Não te mostres sempre rigoroso, nem sempre brando, e escolhe o meio termo entre esses dois extremos, que aí é que bate o ponto da discrição.
Visita os cárceres, os açougues e as praças, que a presença do governador em tais lugares é de muita importância; consola os presos que esperam brevidade no seu despacho; assusta os carniceiros, que por essa ocasião não roubam no peso, e da mesma forma serve de espantalho às regateiras das praças. Não te mostres cobiçoso (ainda que porventura o sejas, o que não creio), nem mulherengo, nem glutão, porque em o povo sabendo o teu fraco, por aí te hão-de bombardear, até te derribarem nas profundas da perdição. Mira e remira, vê e revê os conselhos que te dei por escrito antes que daqui partisses para o teu governo, e verás que achas neles, se os guardares, uma ajuda de custo que te alivie os trabalhos e dificuldades, que a cada passo sobrevêm aos governadores. Escreve a teus senhores e mostra-te agradecido, que a ingratidão é filha da soberba e um dos maiores pecados que se conhecem; e a pessoa, que é agradecida aos que lhe fizeram bem, dá indícios de que também o será a Deus, que tantos bens lhe fez e de contínuo lhe está fazendo.
“A senhora duquesa despachou um próprio, com o teu fato e outro presente, a tua mulher Teresa Pança; esperamos a cada instante a resposta.