para o exercício pastoril; e, chamando-me eu o pastor Quixotiz, e tu o pastor Pancino, andaremos por montes, selvas e prados, cantando ali, recitando endechas acolá, bebendo os límpidos cristais, ou das fontes, ou dos regatos, ou dos rios caudalosos. Dar-nos-ão, com mão abundantíssima, o seu dulcíssirno fruto as altas carvalheiras, assento os troncos dos duríssimos sobreiros, os salgueiros sombra, aroma as rosas, alfombra matizada de mil cores os extensos prados, o ar o seu puro e claro bafejo, luz as estrelas, e a lua, rompendo a escuridade da noite, suave prazer o canto, alegria o choro, versos Apolo, e o Amor conceitos, com que poderemos eternizar a nossa fama, não só nos presentes, mas também nos porvindouros séculos.
— Por Deus! — disse Sancho — quadra-me esse gênero de vida, tanto mais que nunca se lembraram disso, nem o bacharel Sansão Carrasco, nem o barbeiro mestre Nicolau, e talvez a queiram seguir e fazer-se pastores connosco; e praza a Deus que o cura não tenha vontade também de entrar no aprisco, já que tanto gosta de se divertir.
— Disseste muito bem — respondeu D. Quixote — e o bacharel Sansão Carrasco, se entrar no grêmio pastoril, poderá chamar-se o pastor Sansonino, ou o pastor Carrascão; o barbeiro Nicolau chamar-se-á Nicoloso, como o antigo Boscan se chamou Nemoroso; ao cura é que não sei que nome lhe havemos de pôr, a não ser algum que derive de cura: por exemplo — o pastor Curiambro. Às pastoras, nossas enamoradas, é fácil escolher os nomes; e, como o da minha dama tanto quadra a uma princesa como a uma zagala, não preciso de me cansar a procurar outro que melhor lhe caiba: tu, Sancho, lá porás à tua o que quiseres.
— Não tenciono — respondeu Sancho — pôr-lhe nome diferente do de Teresona,