— E que idade tem essa senhora que se cria para condessa? — perguntou o da Selva.
— Quinze anos, pouco mais ou menos — respondeu Sancho — mas é alta como uma lança e fresca como manhã de Abril, e tem força como um trabalhador.
— Isso são partes — respondeu o da Selva — não só para condessa, mas até para ninfa do verde bosque. Oh! que grande patifa que ela há-de ser!
Sancho respondeu um pouco enxofrado:
— Nem é patifa, nem nunca o será, querendo Deus, enquanto eu vivo for; fale mais comedidamente, que para pessoa criada como Vossa Mercê com cavaleiros andantes, que são a própria cortesia, não me parecem mui concertadas essas palavras.
— Oh! como Vossa Mercê entende pouco de louvores, senhor escudeiro! Pois não sabe Vossa Mercê que quando um cavaleiro mete uma boa farpa num touro na praça, ou quando alguém faz alguma coisa bem feita, costuma dizer o vulgo: oh! grande patife, como ele faz aquilo! O que parece vitupério nos termos é notável louvor, e renegue Vossa Mercê de quem não merecer semelhantes elogios!
— Pois então renego — tornou Sancho — e nesse caso chame a todos os meus patifões à vontade; a cada instante fazem coisas dignas desses extremos; e tomara eu torná-los a ver; por isso peço a Deus que me tire deste pecado mortal de escudeiro, em que incorri por causa duma bolsa de cem ducados, encontrada por mim uma vez no coração da Serra Morena, e que me põe a cada instante diante dos olhos um saquitel de dobrões, que abraço, que beijo, que levo para casa, que me dá vida de príncipe, e que me leva a suportar com paciência todos os trabalhos padecidos com este mentecapto de meu amo, que já me vai parecendo mais doido que cavaleiro.
— Por isso — respondeu o da Selva — dizem que a cobiça rompe o