Amor de Perdição - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 21 / 145

– Ignorava parte disso, e não me aflige o sabê-lo. Desde que conheci Simão, não me consta que ele tenha dado o menor desgosto à sua família, nem ouço falar mal dele.

– E está por isso persuadida de que Simão deve ao seu amor a reforma de costumes?

– Não sei, nem penso nisso – replicou com enfado Teresa.

– Não se zangue, prima. Vou-lhe dizer as minhas últimas palavras: eu hei-de, enquanto viver, trabalhar por salvá-la das garras de Simão Botelho. Se seu pai lhe faltar, fico eu. Se as leis a não defenderem dos ataques do seu demónio, eu farei ver ao valentão que a vitória sobre os aguadeiros não o poupa ao desgosto de ser levado a pontapés para fora da casa de meu tio Tadeu de Albuquerque.

– Então o primo quer-me governar!? – atalhou ela com desabrida irritação.

– Quero-a dirigir enquanto a sua razão precisar de auxílio. Tenha juízo, e eu serei indiferente ao seu destino. Não a enfado mais, prima Teresa.

Baltasar Coutinho foi dali procurar seu tio, e contou-lhe o essencial do diálogo. Tadeu, atónito da coragem da filha e ferido no coração e direitos paternais, correu ao quarto dela, disposto a espancá-la. Reteve--o Baltasar, reflexionando-lhe que a violência prejudicaria muito a crise, sendo coisa de esperar que Teresa fugisse de casa. Refreou o pai a sua ira, e meditou. Horas depois chamou sua filha, mandou-a sentar ao pé de si, e, em termos serenos e gesto bem-composto, lhe disse que era sua vontade casá-la com o primo; porém, que ele já sabia que a vontade de sua filha não era essa. Ajuntou que a não violentaria; mas também não consentiria que ela, sovando aos pés o pundonor de seu pai, se desse de coração ao filho do seu maior inimigo. Disse mais que estava a resvalar na sepultura, e mais depressa desceria a ela, perdendo o amor da filha, que ele já considerava morta. Terminou perguntando a Teresa se ela duvidava entrar num convento, e aí esperar que seu pai morresse, para depois ser desgraçada à sua vontade.





Os capítulos deste livro