Amor de Perdição - Cap. 13: Capítulo 13 Pág. 88 / 145

Mas o pai, que fizera uma espantosa mudança de génio, quando tal soube, ameaçou a minha mãe de a obrigar judicialmente a não sair de casa de seu marido e filhas.

Escrevia a mãe a Simão, e não recebia resposta. Pensava ela que o filho não respondia: anos depois, vimos entre os papéis de meu pai todas as cartas que ela escrevera. Já se vê que o pai as fazia tirar no correio.

Uma senhora de Viseu escreveu à mãe, louvando-a pelo muito amor e caridade com que ela acudia às necessidades do seu infeliz filho. Esta carta foi-lhe entregue por um almocreve; quando não, teria o destino das outras. Espantou-se minha mãe do conceito em que a tinha a sua amiga, e confessou-lhe que não o tinha socorrido, porque o filho rejeitara o pouco que ela quisera fazer em seu bem. A isto respondeu a senhora de Viseu que uma rapariga, filha dum ferrador, estava vivendo nas vizinhanças da cadeia, e cuidava do preso com abundância e limpeza, e a todos dizia que ali estava por ordem e à custa da senhora D. Rita Preciosa. Acrescentava a amiga de minha mãe que algumas vezes mandara chamar a bela moça e lhe quisera dar alguns cozinhados mais esquisitos para o Simão, os quais ela rejeitava, dizendo que o senhor Simão não aceitava nada.

De tempos a tempos recebíamos estas novas, sempre tristes, porque na ausência de meu pai, conspiraram, como era de esperar, quase todas as pessoas distintas de Viseu contra o meu desgraçado irmão.

A mãe escrevia aos seus parentes da capital implorando graça régia para o filho; mas aquelas cartas não saíam do correio, e iam dar todas à mão de meu pai.

E que fazia este, entretanto na quinta, sem família, sem glória, nem recompensa alguma a tantas faltas? Rodeado de jornaleiros, cultivava aquele grande montado aonde ainda hoje, por entre os tojos e urzes, que voltaram com o abandono, se podem ver relíquias de cepas plantadas por ele. A mãe escrevia-lhe lastimando o filho; meu pai apenas respondia que a justiça não era uma brincadeira, e que na antiguidade os próprios pais condenavam os filhos criminosos.

Teve a minha mãe a afoiteza de se lhe apresentar um dia, pedindo licença para ir a Viseu. Meu inexorável pai negou-lha, e invectivou-a furiosamente.





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