O Crime do Padre Amaro - Cap. 22: Capítulo 22 Pág. 398 / 478

- Desculpe, senhor pároco, balbuciou, mas hoje tem sido um dia de balbúrdia...

Ele apertou-lhe a mão gravemente; e ficaram calados, como se estivessem separados pela distância dum deserto. Ela não tirava os olhos do chão, enrolando com a mão trêmula uma ponta da manta de lã que trazia solta pelos ombros. Amaro achava-a mudada, um pouco inchada das faces, com uma ruga de velhice aos cantos da boca. Para romper aquele silêncio estranho, perguntou-lhe também se se dava bem...

- Para aqui vou indo... É um pouco triste isto. É como diz o Sr. abade Ferrão, é muito grande para a gente se sentir em família.

- Ninguém veio para aqui para se divertir, disse a velha sem descerrar as pálpebras, com uma voz seca que perdera toda a fadiga.

Amélia baixou a cabeça, fazendo-se pálida.

Amaro então, compreendendo num relance que a velha torturava Amélia, disse com muita severidade:

- É verdade, não foi para se divertirem... Mas também não foi para se entristecerem de propósito... Pôr-se uma pessoa de mau humor e fazer aos outros a vida negra, é uma falta horrível de caridade; não há pecado pior aos olhos do Senhor... É indigno da graça de Deus quem tal pratica...

A velha rompeu a choramigar, muito excitada:

- Ai, o que Deus me guardou para os últimos anos da vida...

Gertrudes animou-a. Então, senhora, que até lhe fazia pior estar a afligir-se assim... Ora o disparate! Tudo se havia de remediar com a ajuda de Deus. Saúde não havia de faltar, nem alegria...

Amélia chegara-se à janela, decerto para esconder também as lágrimas que lhe saltavam dos olhos. E o pároco, consternado com a cena, começou a dizer que D. Josefa não estava suportando com a verdadeira resignação duma cristã aqueles dias de doença...





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