VII
Dias depois o padre Amaro e o cônego Dias tinham ido jantar com o abade da Cortegassa. - Era um velho jovial, muito caridoso, que vivia há trinta anos naquela freguesia e passava por ser o melhor cozinheiro da diocese. Todo o clero das vizinhanças conhecia a sua famosa cabidela de caça. O abade fazia anos, havia outros convidados - o padre Natário e o padre Brito: o padre Natário era uma criaturinha biliosa, seca, com dois olhos encovados, muito malignos, a pele picada das bexigas e extremamente irritável. Chamavam-lhe o Furão. Era esperto e questionador; tinha fama de ser grande latinista, e ter uma lógica de ferro; e dizia-se dele: é uma língua de víbora! Vivia com duas sobrinhas órfãs, declarava-se extremoso por elas, gabava-lhes sempre a virtude, e costumava chamar-lhes as duas rosas do seu canteiro. O padre Brito era o padre mais estúpido e mais forte da diocese; tinha o aspecto, os modos, a forte vida de um robusto beirão que maneja bem o cajado, emborca um almude de vinho, pega alegremente à rabiça do arado, serve de trolha nos arranjos de um alpendre, e nas sestas quentes de Junho atira brutalmente as raparigas para cima das medas de milho. O senhor chantre, sempre correto nas suas comparações mitológicas, chamava-lhe - o leão de Nemeia.
A sua cabeça era enorme, de cabelo lanígero que lhe descia até as . sobrancelhas: a pele curtida tinha um tom azulado, do esforço da navalha de barba; e, nas suas risadas bestiais, mostrava dentinhos muito miúdos e muito brancos do uso da broa.
Quando iam sentar-se à mesa chegou o Libaninho todo azafamado, gingando muito, com a calva suada, exclamando logo em tons agudos:
- Ai, filhos! desculpem-me, demorei-me mais um bocadinho. Passei pela igreja de Nossa Senhora da Ermida, estava o padre Nunes a dizer uma missa de intenção.