A mãe recebe mal o pequenino fauno; depois de um ríspido sermão que ele não entende, despe-o de repelão, dá-lhe de cear, e mete-o na cama sem o doce beijo das boas-noites. A alma de passarinho faz-se ainda mais pequenina, a boquita amuada alonga-se num beicinho triste, volta-se para a parede numa grande renúncia de todas as coisas boas deste mundo, e fica-se a dormir como um bem-aventurado.
De noite, porém, não tem sossego. Sonha com o tanque; põe a cama numa desordem indescritível, toda a roupa num alvoroço; os braços e as pernas são uma dobadoura. A mãe, que se levanta a cobri-lo uma dúzia de vezes, não pode deixar de sorrir ao vê-lo nadar, muito aplicado, com uma expressão de grande seriedade, sobre o travesseiro, com a camisa de noite arregaçada até ao pescoço.
Na escola, mais tarde, é um tormento para lhe captarem a atenção, toda virada para o exterior, incapaz do menor esforço de concentração; não está um momento quieto, todo ele é movimento e vida. Das folhas arrancadas aos cadernos de contas e aos livros, faz espetaculosos chapéus armados de almirante, constrói frotas poderosíssimas, que põe a navegar no mar largo de uma grande barrica, onde a professora guarda a sua provisão de água com que, ao cair da ardente tarde alentejana, mata a sede às violetas e aos lírios do seu pequeno jardim de padre-cura.