OS MORTOS NÃO VOLTAM - Tenho a certeza de que os mortos não voltam.
O velho e simpático Dr. X, quebrando o silêncio em que se tinha emparedado toda a noite, fez esta estranha afirmação num tom tão perentório, com uma tal firmeza de acentuação, com uma tão grande autoridade, que a sua frase, balde de água gelada na exaltação do grupo, fechou a discussão como por encanto.
- Os mortos não voltam - repetiu.
Todos os olhares convergiram para ele. Impassível, eixo da curiosidade geral, puxou mais a cadeira para o vão da janela aberta de par em par sobre a noite cálida e estrelada de Agosto. Sacudiu a cinza do cigarro, aspirou uma lufada de ar carregado dos -aromas dispersos do jardim e do mar, e continuou tranquilamente:
- Eu explico a minha afirmação... e o tom em que a proferi - acrescentou, com um dos seus belos sorrisos, de cujo encanto tinha o segredo e que eram talvez a mais clara explicação dos seus repetidos triunfos na vida. - Se a nossa discussão, meus senhores, não é uma discussão ociosa, o que é muito provável, se semelhante coisa pode entrar tanto quanto possível no domínio dos factos experimentais, se tudo isto que acabámos de dizer não é metafísica pura, a minha afirmação de há pouco tem valor, e eu vou dar-lhes a sua explicação. A minha certeza é o fruto de uma experiência que o acaso preparou magistralmente, numa época em que estes problemas apaixonavam os intelectuais, problemas que deram origem aos soberbos trabalhos de Gurnay, primeiro, e, logo a seguir, de Crooks, Lodge, com o seu célebre Raymond, trabalhos que suscitaram todas as curiosidades no mundo pensante. Nessa época, já relativamente afastada e por assim dizer ainda de ontem, que a época trepidante dos sem-fios e dos aviões destronou, não se falava noutra coisa: alucinações telepáticas, visões, lucidez, pressentimentos, aparições objetivas, etc.