A Origem da Tragédia - Cap. 22: Capítulo 22 Pág. 128 / 164

Apresento ao lado desta, uma confirmação igualmente clara de minha opinião, segundo a qual a ópera está edificada sobre princípios iguais à nossa cultura alexandrínica. A ópera é o nascimento do homem teórico, do leigo crítico, não do artista: um dos fatos mais estranháveis na história de todas as artes. Foi a exigência de ouvintes bem pouco musicais que, antes de tudo, fosse necessário ouvir a palavra de maneira a poder esperar-se um renascimento da arte dos sons, se se descobrisse algum modo de cantar, no qual pudesse governar o texto sobre o contraponto, como o senhor sobre o servo. Pois as palavras são mais nobres do que o sistema harmônico que as acompanha na medida em que a alma é mais nobre do que o corpo. Com a rudeza anti musical e leiga destas conceções foi tratada nos princípios da ópera a ligação de música, imagem e palavra; foi também no sentido desta estética que se fez, nos elegantes círculos de leigos florentinos, por poetas e cantores aí patrocinados, as primeiras experiências. O homem que nada entende de arte, gera para si mesmo uma espécie de arte, justamente em virtude de ser o homem antiartístico por natureza. Por não conhecer a profundidade dionisíaca da música, ele troca o gozo musical em retórica inteligível, de palavra e som da paixão, no stilo rappresentativo e em voluptuosidade das artes de canto; por não poder ter visão nenhuma, obriga a entrar em seus serviços o técnico e o decorador; por não compreender a verdadeira essência do artista, cria para si, o “homem primitivo artístico”, segundo o seu gosto, isto é o homem que canta com paixão, e que recita versos. Ele sonha com uma época em que a paixão é o bastante para produzir canções e poesias: como se a afeição alguma vez tivesse sido suficiente para produzir algo de artístico.





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