As Viagens de Gulliver - Cap. 3: Capítulo I Pág. 56 / 339

Enterram os mortos na-posição vertical, de cabeça para baixo, porque julgam que ao fim de 100 000 luas voltarão a erguer-se e que, entretanto, a Terra (que consideram plana) dará a volta; assim, quando ressuscitarem, estarão de pé. As pessoas cultas reconhecem o absurdo desta doutrina que, por condescendência com a gente simples, continuam a aplicar.

Há neste império algumas leis e costumes muito específicos. E, se não fossem tão diametralmente opostos aos do meu querido país, sentir-me-ia tentado a dizer alguma coisa a seu favor. Gostaria apenas que fossem levados à prática com alguns aperfeiçoamentos. Mencionarei, em primeiro lugar, o que está estipulado quanto aos denunciantes. Qualquer crime contra o Estado é punido aqui com a máxima severidade; mas se o acusado demonstra claramente ante os tribunais que está inocente, o acusador sofre uma morte ignominiosa; e, além dos bens e das terras, o inocente ver-se-á quadruplamente recompensado pela perda de tempo, o risco por que passou, as agruras do encarceramento e os gastos feitos com a sua defesa. Acresce ainda, no caso de insuficiência de fundos, que a coroa recompensa com magnanimidade. Finalmente, o imperador concede alguma distinção pública e é proclamado um édito por toda a cidade em que é declarada a inocência da pessoa em causa.

Consideram a fraude como um crime mais grave que o roubo, pelo que é, quase sempre, castigada com a morte. Porque, com muito senso comum, alegam que a precaução e a vigilância podem preservar os bens de uma pessoa do risco de serem roubados, mas que a honradez carece de defesa contra a astúcia.





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