A Utopia - Cap. 2: Capítulo 2 Pág. 36 / 133

Deste modo, podeis ver a consideração e a importância que dão à minha pessoa e à minha opinião. - Asseguro-vos, caríssimo Rafael - respondi-lhe então -, que tive enorme prazer em ouvir-vos, e que a vossa narrativa foi agradável e espirituosa. Ao ouvir-vos, julgava-me não só em Inglaterra, como me vinha à lembrança o' cardeal, em casa de quem fui educado desde criança, vindo-me à memória esses dias da infância. E, caro Rafael, embora vos estimasse já muito, a vossa consideração pelo cardeal torna-vos ainda muito mais caro ao meu coração.

«Mas, apesar de tudo isto, não consigo mudar de opinião e continuo a acreditar que, se a isso vos decidísseis, os vossos conselhos na corte de um príncipe seriam de grande utilidade para a república. Para mais, esse sacrifício seria para vós um dever, pois é o dever de todo o bom cidadão. Por isso, Platão afirmou que a humanidade atingirá a felicidade perfeita no dia em que os filósofos forem reis e os reis filósofos. Como está longe de nós essa felicidade se os filósofos nem sequer orientam os reis com os seus conselhos.

Rafael respondeu então:

- Não são tão egoístas como afirmais. Fá-lo-iam com muita satisfação, e muitos o fizeram já em livros que publicaram, se os . príncipes e os senhores estivessem dispostos a seguir os conselhos que lhes dão. Mas, sem dúvida, Platão anteviu que os próprios príncipes não seguirão nunca os conselhos dos filósofos, imbuídos como estão, desde a infância, de princípios falsos e preconceitos errados, a menos que os próprios príncipes se apliquem eles próprios no estudo da filosofia. O próprio Platão teve disso experiência na corte de Dionísio, tirano de Siracusa.

«Imaginemos que proponho a um príncipe decretos justos, esforçando-me por arrancar do seu espírito os germes do mal





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