Amor de Perdição - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 31 / 145

Simão, quando isto ouvia, tinha os olhos fitos num vulto, que se aproximava dele, rente com o muro do quintal. O arrieiro, que primeiro o vira, dera um sinal, e entalara as rédeas do cavalo entre umas pedras, para ficar desembaraçado, se o estudante se não pudesse haver com o inimigo.

Simão Botelho não se moveu do local, e Baltasar Coutinho parou na distância de seis passos. O arrieiro tinha lentamente avançado a meio caminho do patrão, quando este lhe disse que não se aproximasse. E, caminhando para o vulto, aperrou duas pistolas, e disse-lhe:

– Isto aqui não é caminho. Que quer?

O fidalgo não respondeu.

– Parece-me que lhe abro a boca com uma bala! – tornou Simão.

– Que lhe importa ao senhor quem está?! – disse Baltasar – Se eu tiver um segredo, como o senhor parece que tem o seu nestes sítios, sou obrigado a confessar-lho!?

Simão reflectiu, e replicou:

– Este muro pertence a uma casa onde mora uma só família, e uma só mulher.

– Estão nesta casa mais de quarenta mulheres esta noite – redarguiu o primo de Teresa. – Se o cavalheiro espera uma, eu posso esperar outra.

– Quem é o senhor? – tornou com arrogância o filho do corregedor.

– Não conheço a pessoa que me interroga, nem quero conhecer. Fiquemos cada um com o nosso incógnito. Boas noites. Baltasar Coutinho retrocedeu, dizendo entre si: «Que partido tem uma espada contra dois homens e duas pistolas?» Simão Botelho cavalgou, e partiu para casa do hospitaleiro ferrador.

O sobrinho de Tadeu de Albuquerque entrou na sala sem denunciar levemente alteração de ânimo. Viu que Teresa o observava de revés, e soube dissimular de modo que a sossegou. A pobre menina, ansiosa por se ver sozinha, viu com prazer erguer-se para sair a primeira família, que deu rebate às outras, menos ao de Castro Daire e suas irmãs, que ficaram hospedados em casa de seu tio, com tenção de se demorarem oito dias em Viseu.

Velou Teresa o restante da noite, escrevendo a Simão a longa história dos seus terrores, e pedindo-lhe perdão de o ela não ter advertido do baile, por ficar doida de alegria com a sua vinda. No tocante ao plano de se encontrarem na seguinte noite não havia alteração na carta. Isto espantou o académico. A seu ver, o vulto era Baltasar Coutinho, e o pai de Teresa devia ser avisado naquela mesma noite.





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