O Crime do Padre Amaro - Cap. 20: Capítulo 20 Pág. 374 / 478

Eu, quando me foram buscar, ia fazer a partida a casa do Novais. É a partida do sábado... Que cena! Morreu na impenitência, como era dos livros. Quando me viu, e que você não vinha, que espetáculo! Até tive medo que me cuspisse no crucifixo...

Amaro, sem dar uma palavra, ergueu uma ponta do lençol, mas deixou-o logo recair sobre a face da morta. Depois subia acima, ao quarto onde o sineiro, estirado sobre a cama, voltado para a parede soluçava desesperadamente; estava com ele outra mulher, que se conservava a um canto, muda, e imóvel, com os olhos no chão, no vago aborrecimento que lhe dava aquele pesado dever de vizinha. Amaro tocou no ombro do sineiro, falou-lhe:

- É necessário resignação, tio Esguelhas... São decretos do Senhor... Para ela é até uma felicidade.

O tio Esguelhas voltou-se; e reconhecendo o pároco, por entre o véu das lágrimas que lhe alagavam os olhos, tomou-lhe a mão, quis beijar-lha. Amaro recuou:

- Então, tio Esguelhas?... Deus há-de ser misericordioso, há-de-lhe levar em conta a sua dor...

Ele não o escutava, sacudido dum pranto convulsivo, - enquanto a mulher, muito tranquilamente, limpava ora um ora outro canto do olho.

Amaro desceu; e para aliviar o bom Silvério daquele serviço excepcional, tomou o seu lugar ao pé da vela, com o Breviário na mão.

Ali ficou até tarde. A vizinha ao sair veio dizer-lhe que o tio Esguelhas tinha pegado a dormir; e ela prometia voltar com a amortalhadeira, mal rompesse a manhã.

Toda a casa então ficou naquele silêncio, que a vizinhança do vasto edifício da Sé fazia parecer mais soturno; só às vezes um mocho piava debilmente nos contrafortes, ou o grosso bordão batia os quartos.





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