As Máscaras do Destino - Cap. 6: A PAIXÃO DE MANUEL GARCIA Pág. 40 / 80

Levava na mão uma soberba bryce elian, de um lindo róseo acarminado, acabada de colher, de passagem, no jardim. Com um golpe de raqueta atirou-a, de brincadeira, à cara de um rapaz alto e loiro que, desastrado, a não conseguiu agarrar. Quando se afastaram e o vestido dela não foi mais que uma mancha clara na estrada cheia de sol, o pobre canteiro foi apanhá-la à rua com o carinho de quem levanta do chão um bebé magoado, lavado em lágrimas e com o vestidinho sujo. Entrou na loja e, delicadamente, com uma paciência infinita, com mil cuidados, lavou-a pétala por pétala, tirou-lhe todo o pó, e guardou-a sem sequer se atrever a beijá-la.

Maria del Pilar, tão perto, estava longe, mais longe que as terras longínquas de além-mar, mais longe que uma estrela cadente, que nem o pensamento a pode seguir pelos céus fora, mas estava ali; não era dele, não, meu Deus! não a podia cobiçar sequer, mas não era de ninguém. Vaso sagrado por onde nenhuma boca matara a sede, templo que nenhuns passos tinham profanado ainda, torre de marfim do seu amor a que nenhum olhar subira, não era dele, não, mas era a Pura, a Intangível, era A que não era de ninguém'.

E Manuel Garcia ia vivendo, talhando a pedra, sereno e mudo, numa castidade absoluta, como um monge ascético dentro da sua Cartuxa de sonhos, com a inconsciência de uma criança que vai, numa noite sem lua, costeando um abismo a rir e a cantar.

Mas um dia - dia maldito aquele! - a notícia do casamento de Maria del Pilar redopiou vertiginosa, como um súbito ciclone, arrastando tudo na sua pobre existência de simples, cheia, a transbordar, das migalhas de um sonho. Assombrou-o. Quando o soube, na oficina, ficou pregado ao chão, a tremer, na desvairada tremura de uma árvore velhinha sacudida pela nortada.





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