As Máscaras do Destino - Cap. 7: O INVENTOR Pág. 51 / 80

Adormece, abraçado a um barco de cortiça e velas de pano-cru, que o pai lhe deu num dia de anos. Os presentes de Artaxerxes fá-lo-iam sorrir de desdém perante a dádiva principesca.

Já homenzinho, nas longas noites de Inverno, acocorado à chaminé onde o madeiro crepita, lê embevecido, horas a fio, todo o Júlio Verne, histórias de piratas e corsários; o navio-fantasma enfeitiça-o; os naufrágios heróicos entusiasmam-no; foi durante anos todos os capitães de navios naufragados, morrendo no seu posto, aos vivas a Portugal!

No liceu sonha com a Escola Naval: é uma ideia fixa. Põe a um gato abandonado, repelente, todo pelado, encontrado numa suja travessa das imediações do liceu, o nome de Marujo-, a uma galinha, a quem endireitara uma perna quebrada, ficou-lhe chamando Canhoneira; o cão, seu companheiro de folias, chamava-se Almirante.

No dia em que pela primeira vez envergou a linda farda da Escola, quando o estreito galão de aspirante lhe atravessou a manga do dólman azul-escuro, foi como se S. Pedro abrisse diante dele, de par em par, as bem-aventuradas portas do paraíso. Era marinheiro! Sabe lá a outra gente o que é ser marinheiro! Para ele, ser marinheiro era a única maneira de ser homem, era viver a vida mais ampla, mais livre, mais sã, mais alta que nenhuma outra neste mundo! O seu forte coração, sedento de liberdade, era, no seu rude arcaboiço de marujo, como um pequeno jaguar saltando do fundo da jaula, estreita e lôbrega, contra as barras de ferro que o retêm afastado da selva rumorosa.

Ao pôr pela primeira vez o pé num navio, lembrou-se do tanque da sua infância e sorriu; o mesmo clarão de dantes, de fascinação e de triunfal alegria, iluminou-lhe os olhos garços; as pálpebras tiveram o mesmo estremecimento de voluptuosidade e cobiça.





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