As Viagens de Gulliver - Cap. 5: Capítulo III Pág. 182 / 339

As populações prendiam as diversas petições aos cabos que, quando eram içados, pareciam as caudas de cometas. Às vezes ofereciam-nos vinho e víveres, que eram içados com a ajuda de roldanas.

Os meus conhecimentos matemáticos foram-me de grande ajuda para aprender a sua fraseologia, tão baseada na ciência e na música; quanto a esta última não sou um desconhecedor. As suas ideias revestem-se sempre de linhas e figuras. Se, por exemplo, querem elogiar a beleza de uma mulher ou de qualquer animal, descrevem-nos com losangos, círculos, paralelogramas, elipses e outros elementos de geometria ou, caso contrário, recorrem a termos técnicos musicais, cuja enumeração é desnecessária. Na cozinha real havia toda a espécie de instrumentos musicais e de modelos matemáticos que serviam de inspiração para se cortar a carne servida à mesa de Sua Majestade.

As casas estão pessimamente construídas, com as paredes facetadas, desprovidas de ângulo recto em qualquer aposento; este defeito reside no menosprezo quanto à geometria prática, rechaçada por ser considerada vulgar e artesanal; as indicações que dão aos artesãos são fonte de contínuos erros, uma vez que aquelas são excessivamente sofisticadas para a inteligência destes. E embora sejam bastante hábeis no manejo da régua, do lápis e do esquadro sobre o papel, nunca vi gente mais tosca, inapta e incapaz nos actos da vida quotidiana, nem mentes tão lentas e inseguras sobre qualquer tema que não seja matemático ou musical. Os seus argumentos são muito pobres, inclinam-se com grande vigor para a contradição, a menos que sustentem uma opinião acertada, o que raramente acontece. São totalmente alheios à inventiva, à imaginação e à fantasia, de forma que o seu léxico carece de termos para expressar estas ideias; o seu pensamento e intelecto vivem circunscritos às duas ciências anteriormente citadas.





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