As Viagens de Gulliver - Cap. 5: Capítulo III Pág. 197 / 339

entreguei-lhe a carta do amigo dignitário da ilha e fui acolhido com grande amabilidade. Este ilustre cavalheiro, cujo nome era Munodi, reservou-me um aposento na sua própria mansão. Ali fiquei durante a minha estadia e fui tratado com uma hospitalidade requintada.

No dia seguinte ao da minha chegada, levou-me de carruagem a visitar a cidade, cuja superfície é cerca de metade de Londres. As casas têm uma construção muito estranha, encontrando-se a maioria em ruínas. As pessoas caminhavam apressadamente, tinham um aspecto taciturno, o olhar fixo e, quase todos, vestiam farrapos. Atravessámos uma das portas da cidade e penetrámos cerca de três milhas pelo campo, onde vi muitos jovens agricultores a cultivar a terra com diversos tipos de alfaias, mas não pude perceber o que faziam e, ainda que a terra parecesse muito fértil, não vi uma única espiga de trigo ou um pedaço de erva. Não pude reprimir a surpresa perante o estranho aspecto da cidade e do campo e atrevi-me a pedir ao meu anfitrião que tivesse a amabilidade de explicar-me por que motivo tanta ocupação e preocupação reflectida nas mãos, rostos e cabeças, não tinha consequências produtivas nas ruas e nos campos. Pelo contrário, nunca tinha visto campos tão mal cultivados, casas tão mal construídas e já em ruínas, ou gente que manifestasse tanta miséria e penúria no seu aspecto e vestuário.

O senhor Munodi era uma pessoa de elevada linhagem. Fora governador de Lagado durante vários anos; mas tinha sido exonerado por incapacidade, devido a uma intriga ministerial. O rei, contudo, tratava-o com afecto, considerando-o um homem bem-intencionado mas de inteligência ridiculamente limitada.

Quando apresentei esta franca análise crítica sobre o país e os seus habitantes limitou-se a responder, entre banalidades, que estava há pouco tempo entre eles para os poder julgar e que cada nação tem os seus costumes próprios.





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