As Viagens de Gulliver - Cap. 6: Capítulo IV Pág. 314 / 339

Não tinha necessidade de subornar, adular ou fazer de alcoviteiro para obter o favor de um poderoso ou do seu favorito. Não precisava de defender-me da fraude ou da opressão. Aqui não havia médicos para fazerem experiências com o meu corpo, nem advogados que me levassem à ruína; ninguém que espiasse os meus actos ou conversas ou quem, por dinheiro, urdisse acusações contra mim. Não existiam aqui intriguistas, censores, desbocados, maldizentes, gatunos, salteadores, rapinantes, vis, truões, jogadores, políticos, eruditos, maçadores, palavrosos, polemistas, violadores, assassinos, ladrões, sabichões, fanáticos de qualquer coisa, sedutores, viciosos, viciados, prisões, machados, cadafalsos, pelourinhos, chibatas, comerciantes, artesãos, vigaristas, orgulho, vaidade, afectação, janotas, brigões, bêbados, prostitutas, bexigas, esposas libidinosas, dissipadoras ou histéricas, pedantes estúpidos ou presumidos, gente importuna, arrogante, arruaceira, revoltosa, fútil, falsa, maldizente, nem tratantes tirados do lodo por causa dos seus vícios, nem nobres metidos nele por causa da virtude, nem patrões, musiqueiros, juízes ou bailariqueiros.

Tive em várias ocasiões o privilégio de ser apresentado a diversos houyhnhnms que visitaram o meu amo ou comeram com ele. Sua Excelência permitiu-me estar presente e escutar a conversa. Com frequência, tanto ele como os seus convidados dignavam-se fazer-me perguntas e escutar as minhas respostas. Nalgumas ocasiões tive a honra de acompanhar o meu amo nas suas visitas. Nunca tomei a liberdade de falar sem me fazerem perguntas e, mesmo assim, a contragosto, pois isso fazia-me perder tempo que deveria utilizar para meu aperfeiçoamento.





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