A Linha de Sombra - Cap. 6: IV Pág. 100 / 155

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Estas palavras agradaram-lhe, mas a sua magreza extrema transformou-lhe o sorriso de satisfação num terrível ostentar dos dentes alongados por baixo do bigode ruivo.

«A saúde dos homens não tem melhorado, comandante?», perguntou ele, muito sério, com uma expressão de interesse que chegava a ser excessiva.

Limitei-me a um gesto vago como resposta e afastei-me da porta do camarote. A verdade era que a doença andava a brincar connosco de um modo tão incerto como o do vento. Passava de um para outro homem, num acesso mais leve ou mais intenso, mas deixando sempre o seu sinal por onde passava, com alguns a não conseguirem manter-se em pé, outros indo-se abaixo durante alguns dias, depois, deixava este, voltava àquele, de tal maneira que todos ficavam com um ar mórbido e tinham nos olhos a expressão apreensiva e o olhar de um animal acossado; entretanto, Ransome e eu, que éramos os dois únicos tripulantes completamente livres de contágio, movíamo-nos afanosamente, por entre os outros, administrando-lhes o quinino. Era um combate a dobrar. Tempo contrário travava-nos pela frente e a doença carregava sobre nós à retaguarda. Devo dizer que os homens eram de boa raça. Encaravam diligentemente o trabalho contínuo de marear as vergas. Mas a energia faltava-lhes nos braços e nas pernas e, quando os via de cima do tombadilho, não era capaz de afastar do meu espírito a medonha impressão de que eles estavam a trabalhar envolvidos numa atmosfera de veneno.

Em baixo, no seu camarote, Burns tinha melhorado a ponto não só de ser capaz de se sentar, mas até de dobrar as pernas para cima. Segurava-as com os braços, só pele e osso, como se fosse um esqueleto animado, irrompendo em fundos suspiros de impaciência.

«A grande coisa, comandante», dizia-me sempre que eu lhe dava ensejo para isso, «a grande coisa seria conseguir que o navio passasse a 8° e 20' de latitude.





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