A Linha de Sombra - Cap. 2: I Pág. 12 / 155

Não se esperava a chegada de qualquer navio com destino à metrópole antes de três ou quatro dias. Como eu era agora um homem sem barco e cortara de momento as minhas relações com o mar, achava-me realmente transformado num simples passageiro virtual. Talvez tivesse sido mais recomendável instalar-me num hotel. Tanto mais que o hotel se encontrava ali bem à vista, a uma pedrada da capitania, baixo mas de fisionomia moderadamente apalaçada, mostrando os seus pavilhões brancos, com colunas, e rodeado de campos de relva, bem tratados. Ali, estava-se bem! Ali poderia ter-me sentido um autêntico passageiro. Mas lancei ao edifício um olhar pouco amigável e dirigi-me para a Casa dos Oficiais e Marinheiros.

Ia andando debaixo do sol sem me preocupar com isso, e depois à sombra das árvores altas da esplanada sem dar pela sua frescura. O calor do Oriente tropical caía através das ramadas desfolhadas, rodeando-me o corpo coberto de roupa ligeira, prendendo-se-lhe com uma incomodidade resistente, como se quisesse roubar-lhe toda a liberdade.

A Casa dos Oficiais era um bungalow amplo, com uma larga varanda e um jardim pequeno, evocando o ambiente dos subúrbios de uma cidade, com arbustos e algumas árvores entre os seus limites e a rua. A instituição era até certo ponto um misto de clube e de pensão, mas conservava ao mesmo tempo um certo clima oficial difuso, em todos os seus cantos, porque era de facto administrada pela capitania do porto. O garante tinha a qualidade e a designação oficiais de «despenseiro». Era um homem pequeno, infeliz e ressequido, que se se vestisse de jóquei pareceria no seu mais perfeito papel natural. Mas era claro que, desta ou daquela vez lhe acontecera na vida, a um ou outro título, estar ligado ao mar.





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