A Linha de Sombra - Cap. 8: VI Pág. 136 / 155

É a única maneira de assustar esse velho meliante que nos anda a desafiar.»

Empurrei-o, sempre a resmungar, de encontro ao corrimão. «Agarre-se aí», disse-lhe em tom brutal. Não sabia o que fazer com ele. Deixei-o apressadamente para ir para junto de Gambril, que chamava por mim em voz extremamente débil, indicando-me que por cima estava a começar a soprar algum vento. Realmente, os meus ouvidos tinham dado conta de um fraco roçagar de lona encharcada, lá no alto, e o entrechocar-se metálico de uma escota de corrente um pouco mais lassa...

Estes sons suscitavam um medo supersticioso, perturbantes, agoirentos, na calma apodrecida do ar em meu redor. Todos os casos que eu ouvira contar de mastaréus de joanete arrancados borda fora, de um momento para o outro, da mastreação de um navio, enquanto nos pisos superiores não havia vento suficiente para apagar um fósforo, me regressavam precipitadamente à lembrança.

«Não consigo ver as velas da gávea e joanete, comandante», proclamava Gambril com a voz a tremer.

«Não mexa no leme. Não há-de acontecer nenhuma novidade», disse-lhe eu confiadamente.

Os nervos do infeliz estavam no limite. Pelo meu lado, não me via em condições muito mais favoráveis. Chegara o instante do ponto de ruptura, mas senti o alívio de perceber bruscamente que o navio estava a seguir avante, como que por si próprio e sem auxílio externo, por baixo dos meus pés. Ouvia nitidamente o planger do vento lá em cima, o estiolar abafado das vagas superiores e dos mastaréus ao serem impelidos pelo vento, tudo muito antes de eu poder sentir a mais leve aragem quando virava a cara para ré, um rosto ansioso e que nada conseguia ver, como o de um cego.

De súbito, o ressoar de uma nota mais poderosa encheu-nos os ouvidos, e a escuridão começou a deslizar pelos nossos corpos, deixando-os absolutamente gelados.





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