Em que corpo se alojará em seguida, de que modo o eu, a identidade da mesma pessoa há de subsistir, como a alma do homem que se tornou imbecil à idade de quinze anos, e morreu imbecil aos setenta, voltará a unir o fio das ideias que teve na idade da puberdade e por que meio um alma, a cujo corpo se cortou uma perna em Europa e perdeu um braço em América, poderá encontrar a perna e o braço, que quiçá se tenham transformado em legumes, ou tenham passado a formar parte integrante da sangue de qualquer outro animal. Não terminaria nunca de detalhar todas as extravagâncias que sobre a alma humana se tem publicado. É singular que as leis do povo predileto de Deus não digam uma só palavra acerca da espiritualidade e da imortalidade da alma, nem fale tampouco disto o Decálogo, nem o Levítico, nem o Deuteronómio. Também é indubitável que em nenhuma parte Moisés proponha aos judeus recompensas e penas em outra vida. Não lhes fala nunca da imortalidade de suas almas, nem lhes disse que esperem ir ao céu, nem lhes ameaça com o inferno. Na lei de Moisés tudo é temporal. No Deuteronómio fala aos judeus deste modo:
»Se depois de haver tido filhos e netos prevaricais, sereis exterminados na vossa pátria e ficareis reduzidos a escasso número, que viverá espalhados pelas demais nações.
»Eu sou um Deus zeloso que castigo a iniquidade dos pais até a terceira e até à quarta geração.
»Honra a pai e mãe, com o fim de viver muitos anos.
»Sempre terás o que comer, a comida não vos faltará nunca.
»Se obedeceres a deuses estrangeiros, serás destruído.