XIII A procissão onde a imprudência colocara um Cristo, o Deus da caridade, nas mãos dum padecente, que ia ser esmagado!... a procissão, onde se via um homem de túnica branca, um algoz de cutelo e alcofa, alguns sacerdotes dum Deus misericordioso!... A procissão descia terrível de repulsiva solenidade para o açougue daquela rês! A tumba da misericórdia fechava aquela orgia de sangue! Era um insulto a Deus! O cadáver dum homem atirado à face do Criador! Um escárnio satânico à inteligência, e ao coração da humanidade!
O préstito parou na praça do sacrifício.
Bernardo com os olhos fitos no céu via nascer a risonha aurora da eternidade. Sorriam-lhe os anjos, e a justiça de Deus mostrava-lhe o seu regaço. A morte do justo era um crepúsculo de nova existência a alumiar-lhe o rosto. Inspirava devoção aquele seu santo sorrir para o seio do céu que lhe abria! Trazia nas mãos a imagem do Redentor; mas lá em cima via ele o Espírito Criador, a grande alma, onde se refugiam as almas dispersas na face deste mundo, e perseguida pelo demónio da ira, e da vingança, eternamente encarnado no homem, a quem a sociedade entregou o azorrague da flagelação do virtuoso.
Bernardo caminhava a passo firme para a escada da forca. Estavam contraídas as respirações. Um gemido, menos sufocado, podia ser ouvido por quinze mil almas que vieram a contemplar aquele aparelho de morte, segundo a lei, formulada pelas inspirações do Evangelho! Pelo código dos perdões! Pelos preceitos do Filho de Deus que morrera, perdoando!