Mais ou menos quando tinha 14 anos e 3 meses, a minha boa ama - devia antes dizer mãe - adoeceu e finou-se. Encontrei-me então numa triste situação, pois, assim que a pobre mulher foi enterrada, as crianças da paróquia confiadas aos seus cuidados foram imediatamente recolhidas por curadores da igreja, a escola fechou e as crianças que nela aprendiam não tiveram outro remédio senão ficar em casa até serem enviadas para outro lado. Quanto ao que a minha ama deixou, a filha, uma mulher casada e com seis ou sete filhos, levou tudo sem perda de tempo e, ao fazê-lo, só encontrou para me dizer, em ar de troça, que a fidalguinha podia começar a trabalhar por conta própria, se quisesse.
Quase perdi a cabeça de susto e fiquei sem saber que fazer, ao ver-me, por assim dizer, escorraçada para o mundo. Como se isso não bastasse, a velha e santa mulher tinha na sua mão vinte e dois xelins meus, que eram todos os bens da pobre fidalguinha, e, quando os pedi à filha, esta descompôs-me, riu-se de mim e disse-me que não tinha nada a ver com o caso.
A boa e pobre mulher falara-lhe nesse dinheiro, dissera-lhe onde se encontrava e que era meu e chegara a chamar-me, uma ou duas vezes, para mo dar, mas, ai de mim!, encontrava-me ausente, a tratar de qualquer assunto, e quando regressei a minha boa ama já não podia falar.