É com horror que falo no tesouro que encontrei; basta dizer que, além da maioria da prata da família, o que já era considerável, encontrei uma cadeia de ouro, antiga e com o fecho partido (não devia ser usada havia alguns anos, mas o ouro não perdera nada com isso), uma caixinha de anéis, a aliança de casamento da senhora, bocados partidos de velhos medalhões do mesmo metal, um relógio de ouro, uma bolsa com cerca de vinte e quatro libras em moedas antigas de ouro e várias outras coisas de valor.
Este foi o maior e pior roubo em que participei, pois, apesar de, como atrás disse, estar já endurecida e insensível, doeu-me a própria alma, quando olhei para aquele tesouro e pensei na pobre e desesperada senhora que tanto perdera no fogo, além daqueles valores, e que naquele momento pensaria, por certo, que pelo menos salvara as suas pratas e os objectos mais valiosos. Que surpresa e angústia as suas quando descobrisse que fora ludibriada e que a pessoa que lhe levara os filhos e os bens não fora mandada, como dissera, pela sua amiga, à qual as crianças tinham sido entregues sem que as tivesse pedido!
Confesso que a crueldade desta minha acção me comoveu muito, que me senti dilacerada por um remorso indizível e que os olhos se me encheram de lágrimas; mas, apesar de ter absoluta consciência da desumanidade que cometia, não tive coragem para restituir o que tirara. A pouco e pouco, os amargos pensamentos abandonaram-me e depressa esqueci as circunstâncias em que cometera o roubo.
Mas isto não foi tudo. Embora tivesse ficado consideravelmente mais rica do que era, esqueci a resolução antes tomada de me retirar quando obtivesse uma fortuna um pouco maior e soube apenas desejar mais e mais. A avareza deu as mãos ao êxito, de tal maneira que deixei de pensar na oportunidade de me retirar, embora soubesse que, se não o fizesse, não podia esperar segurança nem tranquilidade para gozar o que tão criminosamente ganhara.
