Aproveitei o ensejo para o revistar a preceito e tirar-lhe o relógio de ouro, uma bolsa de seda de moedas de ouro, a bela peruca e as luvas orladas de prata, a espada e a bonita caixa de rapé. Por fim abri devagarinho a porta da carruagem e preparei-me para saltar com ela em andamento, mas o veículo parou na rua estreita que fica a seguir a Temple Bar, para deixar passar outra carruagem, e eu desci, fechei a porta e disse adeus ao meu velho peralta e ao carro.
Esta aventura foi absolutamente inesperada e cometida sem premeditação, mas eu não estava já tão longe do período alegre da vida que tivesse esquecido o comportamento a adoptar quando um peralvilho se deixava cegar a tal ponto pela concupiscência que nem sabia distinguir uma mulher velha de uma nova. É certo que parecia ter dez ou doze anos menos do tinha, mas não era nenhuma donzela de 17 anos, e isso via-se com muita facilidade. Não há nada tão absurdo, repugnante e ridículo como um homem aquecido pelo vinho e, ao mesmo tempo, pela luxúria; tem dentro de si dois demónios e é tão capaz de se governar pela razão como um moinho de moer sem água. O vício espezinha tudo quanto há nele de bom, se alguma coisa há; obscurece-lhe a percepção; leva-o a cometer disparates, como, por exemplo, beber quando já está ébrio, escolher uma mulher ao acaso sem saber quem ela é ou o que é, se é séria ou depravada, limpa ou impura, feia ou bonita, velha ou nova; e cega-o ao ponto de o impossibilitar de distinguir. Um homem assim é pior que um louco; instigado pela razão viciosa e corrupta, sabe tanto o que faz como este meu peralvilho quando lhe roubei o relógio e a bolsa de ouro.
São estes os homens acerca dos quais Salomão disse: «Vão como um boi para o matadouro, até um dardo lhes traspassar o fígado.