No meio de tal alarido, faltava-me a presença de espírito necessária para bendizer a misericordiosa Providência, que me arrancara, por assim dizer, das garras de semelhante destruição. Fiquei muda e imóvel, avassalada pela emoção que sentia e incapaz de exprimir o que me ia no coração, pois em tais ocasiões os sentimentos são tão tumultuosos que não podemos governá-los.
Enquanto os pobres sentenciados se preparavam para a morte e o capelão, como lhe chamavam, os acompanhava e lhes recomendava que se resignassem e submetessem ao cumprimento da sentença que lhes fora imposta, eu tremia tanto como tremeria, sem dúvida, se me encontrasse na situação deles, como na véspera esperara encontrar-me. Tremia violentamente, como se sofresse um ataque de sezões, não podia falar e dir-se-ia que perdera a razão. Assim que os puseram nas carroças e os levaram, ao que não tive coragem de assistir, desatei a chorar quase sem saber como, com tanta violência e durante tanto tempo que não sabia que fazer nem como conter o pranto, embora o tentasse com todas as minhas forças e coragem. Este ataque de choro durou quase duas horas, creio que até terem todos deixado este mundo, e sucedeu-lhe uma espécie de alegria serena, penitente e humilde, um verdadeiro transporte de alegria e gratidão. Mas continuei incapaz de exprimir os meus sentimentos por palavras durante quase todo o dia.
À tarde o bom sacerdote visitou-me outra vez e recomeçou os seus habituais discursos. Felicitou-me por me ter sido concedido mais tempo para me arrepender, ao passo que o destino daquelas seis desgraçadas criaturas se cumprira e elas se encontravam agora fora do alcance de quaisquer tentativas de salvação; recomendou-me apaixonadamente que continuasse a acalentar, em relação aos factos da vida, os mesmos sentimentos que acalentara quando me encontrava no limiar da Eternidade e, no fim, recomendou-me que não pensasse que se acabara tudo, pois um adiamento não era um perdão e ele não sabia ainda quais seriam os resultados do que me obtivera.
