Não posso dizer, contudo, que as suas palavras me tenham impressionado a ponto de me convencerem, até que, por fim, me declarou clara- mente que, se recusasse, lamentava muito, mas não poderia continuar a ser para mim o que fora antes; embora o seu amor fosse o mesmo de sempre e eu continuasse a agradar-lhe muito, o sentido da virtude não o abandonara tanto que lhe permitisse deitar-se com uma mulher que o irmão cortejava para esposa. Se me despedisse dele com uma recusa, faria por mim o que pudesse no capítulo de manutenção, como se comprometera, mas, para não me causar surpresas, desde já me dizia que não poderia voltar a ver-me, o que, aliás, não podia esperar dele.
Ouvi as últimas palavras com surpresa e perturbação e tive de fazer um grande esforço para não desmaiar, pois, na verdade, amava-o com uma intensidade difícil de imaginar. Adivinhou os meus sentimentos e suplicou-me que pensasse bem, pois era a única maneira de preservarmos o nosso mútuo afecto. Poderíamos amar-nos como amigos, apaixonadamente e com um amor sem mancha, isento das nossas justas censuras e das suspeitas dos outros, e ele ficaria a dever-me para sempre a sua felicidade, seria meu eterno devedor e pagaria essa dívida enquanto lhe restasse um alento de vida. Conseguiu insuflar-me, assim, uma espécie de hesitação, revelando- -me, em cores fortes, os perigos que me esperavam, sublinhados pelo meu receio de ser escorraçada para o mundo como uma simples prostituta renegada - pois era isso que me esperava -, sem eira nem beira, sem amigos nem conhecidos em qualquer parte do mundo, fora da cidade, e ali não poderia ficar. Tudo isto me aterrava extraordinariamente, tanto mais que ele não perdia uma única oportunidade de carregar o futuro de cores sombrias, se eu recusasse a sua sugestão, ao mesmo tempo que salientava a vida próspera e tranquila que me esperava, se a aceitasse.
