Contou-me então que tivera a sorte de ser colocada em casa de uma boa família e que, por morte da senhora, o marido a desposara a ela, dele tendo o meu marido e a irmã. Depois de enviuvar trabalhara tanto e soubera administrar tão bem as propriedades que fizera delas o que hoje eram, pelo que a maior parte dos nossos bens se deviam aos seus esforços ape- nas, uma vez que era viúva havia mais de dezasseis anos.
Pouca atenção prestei a esta parte da sua história, pois desejava desesperadamente retirar-me e dar expansão à minha angústia, o que fiz pouco depois. Podeis avaliar o estado do meu espírito se vos disser que, depois de reflectir, chegara à conclusão de que aquela mulher era nada mais nada menos que a minha própria mãe e que eu tinha agora dois filhos, e estava de esperanças de outro, do meu próprio irmão, com quem me deitava todas as noites.
Considerava-me agora a mais desgraçada de todas as mulheres do mundo. Se nunca tal história me tivesse sido contada, tudo estaria bem e não seria crime pertencer ao meu marido, pois ignoraria que éramos do mesmo sangue. Assim, era tal o peso que tinha no espírito que não pensava noutra coisa e quase nem conseguia dormir. Revelar a verdade, o que de certo modo me aliviaria, parecia-me inútil, mas escondê-la afigurava-se- -me quase impossível. Receava falar do caso durante o sono, embora tivesse para mim que devia informar o meu marido, mas pensava que, se desvendasse a terrível verdade, o menos que poderia esperar seria perdê-lo, pois ele era um homem tão honesto e tão sério que não continuaria a querer-me por esposa depois de saber que eu era sua irmã. Por isso não sabia que fazer e vivia numa confusão terrível.
Deixo a qualquer homem o cuidado de avaliar as dificuldades em que me via.
