- Não - respondeu ele, chocado.
- Não percebo porque estás para aí a repisar isso da velhice - disse ela então. - Ainda não tenho noventa anos, que eu saiba.
- E alguém disse que os tinhas, por acaso? - replicou ele, ofendido.
Virando a cara, ficaram então calados por algum tempo, entregues aos seus pensamentos. - Não gosto que faças pouco de mim disse então ele.
- Ah, não? - volveu ela, num tom enigmático.
- Não, porque neste momento eu estou a falar a sério. E quando estou a falar a sério não gosto de brincadeiras.
- Queres dizer que ninguém deve fazer troça de ti - retorquiu ela.
- Sim, é isso. E também significa que eu próprio não estou disposto a brincar. Quando me acontece estar sério é assim, não gosto de brincadeiras ou de troças.
Ela ficou silenciosa por alguns instantes.
Depois, numa voz vaga, abstracta, algo dolorida mesmo, disse então:
- Não, não estou a fazer pouco de ti.
Ele sentiu-se como que tomado por uma onda de calor, o coração pulsando-lhe rápido e quente.
- Então acreditas em mim, não é verdade? - perguntou.
- Sim, acredito em ti - replicou ela, numa voz onde ressaltava algo do seu velho cansaço, da sua habitual indiferença, como se só cedesse por já estar cansada e farta. Mas ele não se importou, só dando ouvidos ao entusiasmo que lhe ia no coração, inflamado e jubiloso.
- Concordas então em casar comigo antes de eu partir, digamos, lá pelo Natal? Concordas?...
- Sim, concordo.
- Óptimo! - exclamou ele. - Então está combinado.
E deixou-se estar sentado em silêncio, quase que inconsciente, o sangue fervendo-lhe nas veias, correndo, escaldante, num estonteamento de vertigem, pulsando, frenético, num formigar alucinado, todas as suas fibras