Paraele montar, filialmente Jacinto segurou o estribo. E enquanto a égua se empurrava pelo córrego acima, quase tapada sob o imenso guarda-sol vermelho em que se abrigava o velho, nós recolhemos a casa metendo pela serra da Lombinha, através dos milhos, e depressa, porque eu estalava, aperreado, dentro da roupa preta do meu Príncipe.
- Estão pois acomodados estes senhores, Zé Fernandes, Só resta rezar por eles o padre-nosso que recomenda o abade.
Somente, eu não sei, já não me lembro do padre-nosso. - Não te aflijas, Jacinto: peço à tia Vicência que reze por mim e por ti. É sempre a tia Vicência que reza os meus padre-nossos.
Durante essas semanas que preguicei em Tormes, eu assisti. com enternecido interesse, a uma considerável evolução de Jacinto nas suas relações com a Natureza. Daquele período sentimental de contemplação, em que colhia teorias nos ramos de qualquer cerejeira, e edificava sistemas sobre o espumar das levadas, o meu Príncipe lentamente passava para o desejo da Ação... E de uma ação direta e material, em que a sua mão, enfim restituída a uma função superior, revolvesse o torrão.
Depois de tanto comentar, o meu Príncipe, evidentemente. aspirava a criar. Uma tardinha, ao anoitecer, sentados no pomar, no rebordo do tanque, enquanto o Manuel Hortelão apanhava laranjas no alto de uma escada arrimada a uma alta laranjeira, Jacinto observou, mais para si do que para mim:
- É curioso... Nunca plantei uma árvore! - Pois é um dos três grandes actos, sem os quais, segundo diz não sei que filósofo, nunca se foi um verdadeiro homem... Fazer um filho, plantar uma árvore, escrever um livro. Tens de te apressar, para ser um homem. É possível que talvez nunca prestasses um serviço a uma árvore, como se presta a um semelhante!
- Sim.