Gritei pelo rapaz lívido - que, com faca mais rija, fincando no soalho os sapatos de fivela, arrancou enfim àquele malvado duas tirinhas, finas e curtas como palitos, que engoli juntas, e me esfomearam. De uma garfada findei a costeleta. E paguei quinze francos, com um bom luís de ouro. No troco, que o rapaz me deu, com uma polidez deliciosa de uma civilização muito espalhada, havia dois francos falsos. E por aquela doce tarde de Maio eu saí para tomar no terraço um café cor de chapéu-coco, que sabia a fava.
Com o charuto aceso contemplei o Boulevard, àquela hora em toda a pressa e estridor da sua grossa sociabilidade. A densa torrente dos ónibus, calhambeques, carroças, parelhas de luxo, rolava vivamente, com toda uma escura humanidade formigando entre patas e rodas, numa pressa inquieta, Aquele movimento indescontinuado e rude depressa entonteceu este espírito, por cinco quietos anos afeito à quietação das serras imutáveis. Tentava então, puerilmente, repousar nalguma forma imóvel, ónibus que parara, fiacre que estacara num brusco escorregar da pileca: mas logo algum dorso apressado se encafuava pela portinhola da tipoia, ou um cacho de figuras escuras trepava sofregamente para o ónibus - e, rápido, recomeçava o rolar retumbante. Imóveis, decerto, eram os altos prédios hirtos, como as hirtas ribas de pedra e cal. que, continham, disciplinavam, a torrente ofegante. Mas da rua aos telhados, em cada varanda, por toda a fachada, eram tabuletas encimando tabuletas, que outras tabuletas apertavam - e mais me cansava o perceber a incessância do trabalho, a rija canseira do lucro, que arfava por trás das fachadas decorosas e mudas. E então enquanto fumava o meu charuto, estranhamente se apossaram de mim os sentimentos que Jacinto outrora experimentava no meio da Natureza, e que tanto me divertiam.