Os Crimes da Rua Morgue - Cap. 1: Os crimes da Rua Morgue Pág. 21 / 42

Não vi nada além do que descrevia a Gazette des Tribunaux; Dupin esquadrinhou tudo, inclusive o corpo das vítimas. Passámos depois aos outros quartos e ao pátio, acompanhados por um gendarme. Este exame durou muito tempo e era já noite fechada quando saímos da casa. No caminho, o meu companheiro fez uma breve paragem nos escritórios de um jornal diário.

Já disse que as manias do meu amigo eram muitas e variadas e je les ménageais (não encontro equivalente em português para esta palavra). Dera-lhe agora para não pronunciar palavra sobre o crime, e assim esteve mudo e quedo até cerca do meio-dia seguinte. Perguntou-me então, de chofre, se eu observara qualquer coisa de esquisito na cena das atrocidades.

Havia qualquer coisa na maneira como pronunciou «esquisito» que me arrepiou sem que eu soubesse porquê.

- Não, não vi nada esquisito - disse eu -, pelo menos mais nada do que aquilo que lemos no jornal.

- A Gazette - disse ele - não penetrou, creio eu, todo o estranho horror do caso. Mas esqueçam-se as opiniões desse jornaleco. Parece-me que este mistério é considerado insolúvel precisamente pela razão que devia levar a considerá-lo de fácil solução, ou seja o seu carácter outré. A polícia está desnorteada pela aparente falta de motivo (não propriamente pelo crime, mas pela atrocidade do crime). Também estão confusos pela aparente impossibilidade de conciliar as vozes ouvidas na discussão com o facto de não se ter encontrado ninguém no quarto lá de cima além da assassinada Mademoiselle L’Espanaye, nem haver qualquer possibilidade de alguém fugir sem passar pelo grupo dos vizinhos. A terrível desordem do quarto; o corpo enfiado de cabeça para baixo na chaminé; as horrendas mutilações





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