Os Crimes da Rua Morgue - Cap. 1: Os crimes da Rua Morgue Pág. 24 / 42

O inglês pensa que se trata de um alemão e «não percebe alemão». O espanhol tem «a certeza» que era um inglês, mas «calcula pela entoação», já que «não tem conhecimentos de inglês». O italiano acha que era a voz de um russo, «mas nunca conversou com um nativo da Rússia». Um outro francês discorda do primeiro e declara que a voz era de um italiano; mas, como não conhece essa língua, faz como o espanhol e «baseia-se na entoação», que estranha e invulgar devia ser na realidade essa voz para suscitar tantas e tão controversas testemunhas! Uma voz em cuja entoação indivíduos das cinco grandes nações europeias não conseguiram encontrar nada de familiar! Dir-me-ás que podia ser a voz de um africano ou de um asiático. Nem os africanos nem os asiáticos abundam em Paris; mas sem negar essa possibilidade, chamo a tua atenção para três pontos. Uma das testemunhas define assim a voz: «mais áspera que aguda». Outras duas dizem que falava «num tom rápido e aos sacões», e nenhuma delas conseguiu distinguir palavras nem sons semelhantes a palavras.

»Não sei - continuou Dupin - que impressão pude produzir no teu espírito; mas não hesito em afirmar que se podem fazer deduções legítimas desta parte dos depoimentos (a parte referente à voz rouca e à voz aguda), deduções mais que suficientes para criar uma suspeita que poderá levar à solução do mistério. Eu disse «deduções legítimas»; mas esta expressão não traduz fielmente o meu pensamento. O que eu quero dizer é que estas deduções são as únicas correctas e que a suspeita surge como o seu corolário inevitável. Contudo não te direi já que suspeita é essa. Só quero que compreendas que foi suficiente para dar uma forma definida, uma certa orientação, às investigações que fiz no quarto.

»Deixemos agora que a nossa imaginação nos transporte ao local do crime.





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