- Que é que sente?
- Estou esgotado.
- Então posso servir-me? - perguntou Tom. - Mas ao telefone estava bem espevitado!
Com esforço, Wilson saiu da sombra e do apoio da ombreira da porta e, respirando com dificuldade, desatarraxou o tampão do depósito de gasolina. À luz do dia, o seu rosto parecia verde.
- Não queria interromper-lhe o almoço - disse. - Mas como ando muito mal de dinheiro, queria saber o que tencionava o senhor fazer com o seu carro velho.
- Que lhe parece este? - perguntou Tom. - Comprei-o a semana passada.
- O amarelo é muito bonito! - disse Wilson, enquanto se esforçava a dar à bomba.
- Quer comprá-lo?
- Assim eu pudesse! - disse Wilson, e sorriu, abatido. - Esse não, mas com o outro podia fazer algum dinheiro.
- Mas para que é que quer o dinheiro, assim de repente?
- Já estou farto de viver aqui. Quero ir-me embora. A minha mulher e eu queremos ir para o Oeste.
- A sua mulher também quer ir? - exclamou Tom, alarmado.
- Há dez anos que fala nisso - descansou um momento contra a bomba, protegendo os olhos do sol. - E agora vai mesmo, quer ela queira ou não queira. Daqui, hei-de eu levá-la!
O coupé passou por nós num relâmpago, com uma lufada de pó e uma mão a acenar.
- Quanto lhe devo? - perguntou Tom asperamente.
- De há dois dias para cá é que eu comecei a abrir os olhos e a perceber umas certas coisas - observou Wilson. - É por isso que eu me quero ir embora. E por isso é que tenho andado a maçá-lo com a história do carro.
- Quanto lhe devo?
- Um dólar e vinte.
O calor implacável começava a confundir-me e passei ali um mau bocado antes de compreender que, até agora, não era sobre Tom que as suspeitas de Wilson recaíam. Descobrira que Myrtle tinha uma vida qualquer à parte da sua, num outro mundo, e o choque deixara-o fisicamente doente.