Passou-lhe, e ele começou a falar exaltadamente para Daisy, negando tudo, defendendo o seu nome contra acusações que nem sequer lhe tinham sido feitas. Mas, como a cada palavra sua ela se encolhia mais e mais, ele acabou por desistir e só o sonho morto continuou a debater-se na tarde que se escapulia, esforçando-se por tocar o que deixara de ser tangível, lutando em vão, mas desesperadamente, por recuperar aquela voz perdida no outro lado da sala.
E a voz tornou a suplicar que nos fôssemos embora:
- Por favor, Tom! Não aguento mais isto!
Os seus olhos, assustados diziam que todas as intenções, toda a coragem que tivera, se tinham ido para sempre.
- Vocês os dois vão indo para casa, Daisy - disse Tom. - No carro do senhor Gatsby.
Ela olhou para Tom, agora alarmada, mas ele insistiu com magnânimo desdém:
- Vai lá! Ele não vai molestar-te. Acho que já percebeu que o seu presunçoso galanteio acabou.
E assim partiram, sem uma palavra, separados, tornados acidentais, isolados como fantasmas, mesmo da nossa piedade.
Passado um momento, Tom levantou-se e começou a embrulhar na toalha a garrafa de uísque, que continuava intacta.
- Querem alguma coisa daqui? Jordan?.. Nick? Não respondi.
- Nick? - voltou a perguntar-me.
- O quê?
- Quer um copo?
- Não... Estava agora mesmo a lembrar-me de que faço anos hoje.
Fazia trinta anos. E diante de mim estendia-se a portentosa e ameaçadora estrada de uma nova década.
Eram sete horas da tarde quando nos metemos com ele no coupé e partimos para Long Island. Tom falava sem cessar, exultante e risonho, mas a sua voz era tão estranha a Jordan e a mim como o clamor dos forasteiros nos passeios, ou o tumulto da ferrovia aérea por cima de nós. A simpatia humana tem os seus limites, e agradava-nos deixar que todas aquelas trágicas discussões se extinguissem atrás de nós como as luzes da cidade.